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terça-feira, 30 de agosto de 2011


sAPOS SENTADOS

Muita luz para que possamos ver...
                                                            
Otto Lara Resende                                                 
Obrigado Rô


Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta.
 
Um poeta é só isso: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar... vê, não vendo.
 
Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia sem ver.

Parece fácil, mas não é.
O que nos é familiar, já não desperta curiosidade.
O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta.
Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe.
De tanto ver, você não vê.
 
Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo porteiro.
Dava-lhe bom-dia e, às vezes, lhe passava um recado ou uma correspondência.
Um dia, o porteiro cometeu a descortesia de falecer.
Como era ele? Sua cara, sua voz, como se vestia? Não fazia a mínima idéia. Em 32 anos, nunca o viu.
Para ser notado, o porteiro teve que morrer. 
Se um dia, no seu lugar estivesse uma girafa cumprindo o rito, pode ser que ninguém desse por sua ausência.
 
O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem.
Mas, há sempre o que ver: gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos. 
Uma criança vê o que um adulto não vê., pois tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo.
 
O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de tão visto, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho, marido que nunca viu a própria mulher. 
Isso exige muito. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença...

Um comentário:

  1. Obrigada Carlos, é um texto maravilhoso...Muitas vezes não vemos um palmo à frente; a indiferença, a rotina nos leva num turbilhão...
    Que possamos receber e ter essa luz espiritual para "enxergarmos" nosso cosmos e seus seres humanos maravilhosos....

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